-
Placar no STF de 3 a 0: Constituição não prevê 'poder moderador' ou intervenção militar
-
O STF julga a ação do PDT sobre papel das Forças Armadas. Relator, Fux esclarece que a Constituição não encoraja 'ruptura democrática'; Toffoli e Dino acompanharam posição.
- Por Camilla Ribeiro
- 31/03/2024 17h11 - Atualizado há 8 meses
Neste domingo o Supremo Tribunal Federal formou um placar de 3 votos a 0 para esclarecer, em uma ação apresentada pelo PDT, os limites para a atuação das Forças Armadas.
Luiz Fux, relator da ação, votou nesta sexta (29) declarando que a Constituição não permite uma “intervenção militar constitucional” e nem encoraja uma ruptura democrática. Ministro Luiz Roberto Barroso acompanhou o voto.
Durante este domingo, Flávio Dino manifestou seu voto para acompanhar a posição de Fux, mas, diferente de Barroso, depositou um voto por escrito com mais argumentos.
O julgamento ocorre em plenário virtual e a apresentação dos votos dos ministros acontece em sistema eletrônico, até o próximo dia 8. Votos de oito ministros ainda faltam ser apresentados.
No seu voto Dino diz que o julgamento ocorre "em data que remete a um período abominável da nossa História Constitucional: há 60 anos, à revelia das normas consagradas pela Constituição de 1946, o Estado de Direito foi destroçado pelo uso ilegítimo da força".
De acordo com o ministro, "tal tragédia institucional resultou em muitos prejuízos à nossa Nação, grande parte irreparáveis".
“São páginas, em larga medida, superadas na nossa história. Contudo, ainda subsistem ecos desse passado que teima em não passar, o que prova que não é tão passado como aparenta ser”, escreveu.
Dino disse que é preciso eliminar “quaisquer teses que ultrapassem ou fraudem o real sentido do artigo 142 da Constituição Federal, fixado de modo imperativo e inequívoco por este Supremo Tribunal”.
“Com efeito, lembro que não existe, no nosso regime constitucional, um 'poder militar'. O poder é apenas civil, constituído por três ramos ungidos pela soberania popular, direta ou indiretamente. A tais poderes constitucionais, a função militar é subalterna, como aliás consta do artigo 142 da Carta Magna”, disse Dino.
O artigo 142 da Constituição que foi citado por Dino diz:
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
Os ministros estão julgando uma ação que coloca em debate pontos de uma lei de 1999 que trata da atuação das Forças Armadas.
O partido questiona três pontos da lei:
-hierarquia "sob autoridade suprema do presidente da República";
-definição de ações para destinação das Forças Armadas conforme a Constituição;
-atribuição do presidente da República para decidir a respeito do pedido dos demais Poderes sobre o emprego das Forças Armadas.
Voto do relator
No voto do relator, primeiro voto incluído no julgamento, Fux destacou que a Constituição não autoriza o presidente da República recorrer às Forças Armadas contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, e que também não concede aos militares a atribuição de moderadores de eventuais conflitos entre os três poderes.
"Qualquer instituição que pretenda tomar o poder, seja qual for a intenção declarada, fora da democracia representativa ou mediante seu gradual desfazimento interno, age contra o texto e o espírito da Constituição", disse Fux no voto.
No voto, o ministro defendeu que o Supremo estabeleça que:
-a missão institucional das Forças Armadas na defesa da Pátria, na garantia dos poderes constitucionais e na garantia da lei e da ordem não acomoda o exercício de poder moderador entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário;
-a chefia das Forças Armadas é poder limitado e não pode ser utilizada para indevidas intromissões no funcionamento independente dos outros poderes;
- a prerrogativa do presidente da República de autorizar o emprego das Forças Armadas, por iniciativa própria ou por intermédio dos presidentes do STF, do Senado ou da Câmara dos Deputados não pode ser exercida contra os próprios poderes entre si;
-o emprego das Forças Armadas para a “garantia da lei e da ordem” presta-se ao excepcional enfrentamento de grave e concreta violação à segurança pública interna, em caráter subsidiário, após o esgotamento dos mecanismos ordinários e preferenciais de preservação da ordem pública.
Segundo Fux, apesar da lei dizer que o presidente da República tem "autoridade suprema" sobre as Forças Armadas, essa autoridade "não se sobrepõe à separação e à harmonia entre os poderes”.
O ministro evidenciou que nenhuma autoridade está acima das demais ou fora do alcance da Constituição, sendo que essa expressão de autoridade suprema trata da “relação a todas as demais autoridades militares, mas, naturalmente, não o é em relação à ordem constitucional”.
O relator afirmou que a Constituição prevê regras excepcionais, condicionadas a controles exercidos pelo Legislativo ou pelo Judiciário.
“Dessa forma, considerar as Forças Armadas como um "poder moderador" significaria considerar o Poder Executivo um superpoder, acima dos demais, o que esvaziaria o artigo 85 da Constituição e imunizaria o Presidente da República de crimes de responsabilidade”, escreveu o ministro.