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Relatos dos militares em depoimentos à PF sobre participação de Bolsonaro em trama golpista
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O ex-comandante do Exército, Freire Gomes declarou que Bolsonaro apresentou uma minuta de decreto com objetivos golpistas. Brigadeiro Baptista Jr., da Aeronáutica, relatou que Freire Gomes alertou que prenderia Bolsonaro.
- Por Camilla Ribeiro
- 15/03/2024 21h39 - Atualizado há 9 meses
Nesta sexta-feira (15), o Supremo Tribunal Federal (STF) retirou o sigilo dos depoimentos de militares e políticos à Polícia Federal sobre uma tentativa de golpe de Estado.
A investigação ouviu o ex-presidente Jair Bolsonaro, ex-ministros de seu governo e ex-comandantes militares.
Os depoimentos que foram revelados colocam Bolsonaro no centro da trama golpista. O presidente tinha conhecimento das minutas para impedir a posse de Lula e também as discutiu com os chefes das Forças Armadas.
A PF declarou que Bolsonaro e seus aliados próximos planejaram um golpe de Estado para manter o então presidente no poder e impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que ganhou as eleições em outubro de 2022.
Os relatos atingem a estratégia de defesa do ex-presidente. Bolsonaro, inicialmente, dizia que não ter conhecimento sobre as minutas.
Em seguida passou a dizer que a decretação de estado de defesa no TSE para sustar a eleição, é permitida pela Constituição.
Porém, os relatos dos militares apontam que não havia motivo legal para esse estado de defesa, e que a única intenção era mesmo o golpe de Estado.
Ao declarar estado de defesa no TSE, Bolsonaro procurava a intervenção no tribunal e revisão do resultado eleitoral, que já havia sido considerado legítimo por autoridades nacionais e internacionais.
-"Não tive conhecimento [da minuta de golpe]. Não existe golpe com respaldo jurídico. Golpe é pé na porta e arma na cara, meu Deus do céu. Golpe tem que depor alguém", declarou Bolsonaro em junho de 2023.
- "Nunca chegou a mim nenhum documento de minuta de golpe, nem nunca assinei nada relacionado a isso. Até porque ninguém dá 'golpe' com papel", disse Bolsonaro em fevereiro de 2024.
Vejam o que disseram os militares nos depoimentos dados à PF sobre a participação de Bolsonaro:
General Freire Gomes
O general Freire Gomes era comandante do Exército quando Bolsonaro perdeu as eleições para Lula e quando o plano golpista tomou força no núcleo do governo. O general falou na condição de testemunha, e não de investigado.
Segundo as investigações da PF, Freire Gomes participou de uma reunião com o ex-presidente e demais comandantes militares na qual Bolsonaro falou sobre uma minuta de decreto golpista.
A minuta pretendia instaurar um estado de defesa no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e "apurar a conformidade e legalidade do processo eleitoral" de 2022.
Em seu depoimento, Freire Gomes confirmou a reunião e a minuta.
"Na referida reunião, possivelmente Filipe Martins [então assessor de Bolsonaro] leu o referido conteúdo aos presentes e depois se retirou do local, ficando apenas os militares, o então ministro da Justiça [Anderson Torres] e o então Presidente da República, Jair Bolsonaro", disse Freire Gomes.
O ex-comandante disse à PF que Bolsonaro descreveu o documento como "em estudo" e disse que depois "reportaria a evolução aos comandantes".
Freire Gomes declarou também no depoimento que uma nova reunião foi realizada uma semana após, também no Palácio da Alvorada. Sendo apresentada uma nova versão do texto, semelhante à do documento encontrado na casa de Torres, também alvo da operação.
O ex-comandante disse aos investigadores que "em outra reunião no Palácio da Alvorada, em data em que não se recorda, o então presidente Jair Bolsonaro apresentou uma versão do documento com a decretação do estado de defesa e a criação da comissão de regularidade eleitoral para 'apurar a conformidade e legalidade do processo eleitoral'."
De acordo com o ex-comandante, nesta reunião, estavam presentes ele, o ex-presidente Bolsonaro, o ex-comandante da Marinha, almirante Garnier, o ex-comandante da Aeronáutica, brigadeiro Carlos Baptista Junior e o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira.
À PF, Baptista Jr. declarou que, se não fosse a recusa de Freire Gomes, o golpe provavelmente teria ocorrido.
"Indagado se o posicionamento do general Freire Gomes foi determinante para que uma minuta do decreto que viabilizasse um golpe de Estado não fosse adiante respondeu que sim; que caso o comandante tivesse anuído, possivelmente a tentativa de Golpe de Estado teria se consumado", afirma o registro do depoimento
As investigações também apontaram que aliados próximos de Bolsonaro, em trocas de mensagens, xingavam Freire Gomes por não estar aderindo ao movimento golpista.
O general e ex-vice na chapa eleitoral de Bolsonaro, Braga Netto, em conversa com outro militar, chama Freire Gomes de "cagão".
Brigadeiro Baptista Jr.
O brigadeiro Baptista Jr. era comandante da Aeronáutica. Em depoimento, ele declarou que Freire Gomes disse a Bolsonaro, em reunião com os comandantes das Forças Armadas, que prenderia o ex-presidente se ele tentasse consumar o plano golpista. O almirante também falou na condição de testemunha.
O documento da PF que registra a fala de Baptista Jr. diz o seguinte:
"Em uma das reuniões dos comandantes das Forças com o então presidente após o segundo turno das eleições, depois de o presidente da República, Jair Bolsonaro, aventar a hipótese de atentar contra o regime democrático, por meio de institutos previstos na Constituição (GLO [Garantia da Lei e da Ordem], ou estado de defesa, ou estado de sítio), o então comandante do Exército, general Freire Gomes, afirmou que caso tentasse tal ato teria que prender o presidente da República", disse o brigadeiro.
A partir de novembro de 2022, o ex-comandante da Aeronáutica declarou ter participado de diversas reuniões com o então presidente e integrantes da cúpula das Forças Armadas.
De acordo com o depoimento, nesses encontros, Bolsonaro apresentou documentos com caráter golpista aos militares.
Baptista Jr. afirma que nas reuniões, o ex-presidente "apresentava a hipótese de utilização da Garantia da Lei e da Ordem – GLO e outros institutos jurídicos mais complexos, como a decretação do Estado de Defesa, para solucionar uma possível 'crise institucional'".
Almirante Almir Garnier
O então comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, ficou calado em seu depoimento à PF.
O ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), Mauro Cid, citou o almirante em delação premiada.
De acordo com Cid, Garnier seria favorável a um golpe de Estado e teria dito a Bolsonaro “que sua tropa estaria pronta para aderir a um chamamento do então presidente”.